terça-feira, 5 de abril de 2016

IMPEACHMENT DE PROFESSORES? Resposta a artigo da revista VEJA

Esse é o título dado pelo economista Cláudio de Moura Castro ao artigo publicado na revista Veja dessa semana (3 de abril de 2016), onde, em apertada síntese, o colunista afirma que os professores públicos são a única classe que não aceita que se imponha avaliação sobre os resultados do seu trabalho. E, em segundo plano, propõe as formas de avaliação que seriam utilizadas no magistério público.

Primeiro, nunca ouvi falar de qualquer resistência, por parte do magistério, quanto aos inúmeros programas de avaliação dos resultados da educação. Pesquisando agora, após o texto de Castro, também nada encontrei. Ao contrário, os professores são participativos, nas escolas, na aplicação das chamadas provas de avaliação. Nem os sindicatos da classe manifestam-se contra a realização das avaliações, que acontecem nos três níveis, municipal, Estadual e Federal.

Segundo, o articulista da revista Veja afirma que não existem avaliações no Brasil do ensino público. Outro equívoco. Existem hoje, em pleno funcionamento, além do ENEM (desde o ano de 1998), inúmeros sistemas de avaliação do ensino nos Estados. Em pesquisa aleatória, identificamos sistemas funcionando no Estado do Acre (SEAP, desde 2009), Minas Gerais (SIMAVE, desde 2000), São Paulo (SARESP, desde 2002), Rio de Janeiro (SAERJ, desde 2008), Bahia (SABE, desde 2007) e Rio Grande do Sul (SEAP, desde 2009). Muito provavelmente outros entes federados dispõem de sistemas semelhantes.

É de se saber que esses sistemas são concorrentes, em vários aspectos, do próprio ENEM, ou seja, os educandos são avaliados duplamente. Obviamente que tais sistemas avaliam diretamente o trabalho dos professores, que são uma parte importante do ensino público.

Terceiro, o país, ao querer avaliar os resultados da educação, deveria, antes de tudo, pesando sobremaneira a carga no professor, que, no final é o único levado em consideração, ater-se a outros aspectos, tais como, material didático utilizado no ensino público, treinamento e preparação pedagógica e técnica dos docentes, inclusive com amplo acesso à modernização do ensino, aspectos físicos das escolas, incluindo acesso à internet e a equipamentos de informática de qualidade, atualizados. E, obviamente, aspectos físicos das escolas, tais como, iluminação, saneamento, acesso a água tratada e prédios em condições mínimas de habitabilidade.

Avaliar o professor pelo desempenho do aluno sem considerar esses aspectos mínimos, é desrespeitar o magistério, avacalhar a educação e tratar a educação como de somenos importância das políticas públicas do país.

Isso para deixarmos de lado os aspectos como péssima remuneração, falta de segurança, falta de apoio pedagógico e até falta de giz.

Em pesquisa junto aos sites especializados e os próprios números divulgados pelo Governo no chamado Censo Escolar, que avalia também a educação pública, temos alguns dados interessantes. Vejamos. Em 2003, 35 mil escolas públicas brasileiras não recebiam fornecimento de energia elétrica. Isso mesmo, alunos assistiam “aulas” no escuro. Não estou falando do século passado, nem do tempo da carochinha, mas de 2003. Em 2010 esse número caiu para 13.134 escolas sem energia elétrica, atingindo 429.805 alunos. Ou seja, meio milhão de alunos assistem aulas sem conseguir enxergar o que está sendo passado no quadro. Isso quando existem quadros.

Em 2014, ou seja, ali atrás mesmo, 8 mil escolas funcionavam sem energia elétrica no Brasil. Na pesquisa cheguei a ler a comparação. O Brasil consegue instalar uma agência da Caixa Econômica Federal em cada cidade, mas não consegue ligar energia elétrica nas escolas públicas.

Quando o assunto é internet a situação piora bem, pois 60% das escolas públicas não dispõem de internet para utilização no seu dia-a-dia. São 151 mil unidades escolares sem acesso à rede mundial de computadores.

Quer saber do saneamento básico em 2014 nas escolas? Pois bem, apenas 40, 73 % das escolas públicas brasileiras dispõem de uma rede de saneamento ativa. E 38% não têm abastecimento de água da rede pública, que significa água tratada.

O economista quer avaliar professores de escolas que não dispõem de laboratório de ciência em 90% das unidades escolares. No mínimo é um contrassenso. Os professores da área de ciência e biologia seriam crucificados já no primeiro dia.

Em recente artigo nosso sobre a educação do maior Estado da nossa federação, São Paulo, temos que eles têm um piso salarial para os seus professores, de R$ 1.894,12, comparando com o Distrito Federal, o maior Estado perde feio, pois o Distrito Federal, um pequeno Estado (tem o 7º lugar no PIB), paga, aos seus profissionais, R$ 2.260,08.

Além do desestímulo salarial, o professor enfrenta, em todos as escolas, problemas com violência, ameaça de alunos, intervenção do tráfico de drogas, das gangues, das milícias, que chegam a interromper aulas em dias determinados, além dos problemas de trânsito, transporte coletivo de péssima qualidade e a necessidade, haja vista o baixo salário, de acúmulo de cargos e/ou a situação vexatória de ter que ocupar-se em outras atividades econômicas como vender produtos por catálogo, comercializar salgadinhos, quentinhas e doces, visando complementar a renda escolar.


Avaliações são sempre bem-vindas, emérito dirigente do Sistema Pitágoras, Dr. Cláudio, um dos maiores complexos educacionais da rede particular do país, mas ele deve ser seguido de melhoria ou oferta de condições reais de trabalho. Sem energia, sem internet, sem acesso a bons treinamentos e oferta de cursos de aperfeiçoamento, é impossível falarmos num ensino de primeiro mundo.

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